quarta-feira, 24 de junho de 2009

As pessoas para quem eu dava bom dia

"O que aconteceu, meu deus?", eu me perguntava segurando uma xícara de café sentada na cama com as minhas pernas apoiadas sobre as almofadas.
O quarto estava frio e lá fora estava cinza, o relógio marcava duas ou três horas da manhã e eu me perguntava incessantemente "o que aconteceu, meu deus? o que aconteceu, meu deus?..."
Quando me dei conta de que tinha uma xícara com café nas mãos o café estava frio e era desnecessário, tudo o que eu precisava era de deus, das pessoas pra quem eu dava bom dia sorrindo e parar o tempo.
Até ali eu nunca precisara disso que eu chamei de deus. Até ali eu nunca precisara congelar no tempo. Até ali eu nunca precisara das pessoas para quem dava bom dia. Eu as tinha. Mas eu tive antes, muito antes, alguns anos, meses ou dias. Não lembro quando foi a última vez que eu vi as pessoas para quem eu dava bom dia, só me dei conta da falta delas ali, sentada na minha cama numa madrugada segurando uma xícara de café frio.
Me livrei da xícara, voltei a sentar na cama e fiquei ali a contemplar os porta-retratos com as fotografias das pessoas para quem eu dava bom dia. As fotografias me traziam mais que sorrisos, flashes, por-do-sol, amizade. Elas me davam bom dia, sem sorriso, e, acima de tudo, me diziam que as coisas mudam. Elas me mandavam acordar e mudar também. E eu dizia que as coisas mudam, mas que não somos coisas, "meus amores, não somos coisas que se perdem, não somos coisas que se quebram, meu bom dia acompanhado de sorriso não era uma coisa!". Mas elas continuavam a me dizer "as coisas mudam, as coisas mudam, as coisas mudam". E eu dizia que não, eu perguntava a deus o porquê.
Deus não me respondeu, talvez estivesse muito ocupado ou nem existisse. Ou eu não tive fé suficiente naquele momento.
O tempo não parou e eu tive de me levantar e preparar mais uma vez café, agora ele era necessário e eu o tomei ainda quente. Segui meu caminho, seguindo minha rotina, entrei na mesma sala de sempre e pronunciei um bom dia sem sorriso, em tom de obrigação. As pessoas me responderam à mesma altura e, além de "bom dia", elas me diziam "as coisas mudam, meu bem, as coisas mudam".
E eu continuo perguntando a deus o porquê. Ele insiste em não responder e eu insisto em não mudar.

Um comentário:

  1. confesso que esse ano de um lado sinto falta das pessoas pra quem eu dava bom dia, das pessoas com quem passava boons dias. Do outro lado tudo se opoe a mim e me obriga a mudar.

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